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Um polo de eficiência energética e engenharia em Campinas

Laboratório vivo da Unicamp foi destaque no site da SEESP

Reportagem publicada no site da SEESP
Texto e fotos: Jéssica Silva

Um ecossistema de inovação para melhorar a própria infraestrutura, aprimorando pesquisas e desenvolvendo tecnologias. Essa é a proposta do Campus Sustentável, projeto da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), que desde 2017 tem ações voltadas à transição energética na instituição.

Seguindo o conceito de “laboratório vivo”, o campus conta com a atuação dos alunos que colocam em prática o que veem em sala de aula, conforme conta seu coordenador, o professor Luiz Carlos Pereira da Silva. “Queremos formar alunos melhores, que tenham um bom contato com o que tem de mais avançado na teoria, nas metodologias acadêmicas e científicas, e que também usam um capacete, uma bota e participam de um projeto concreto, uma experiência real”, afirma ele.

O projeto teve aporte de cerca de R$ 9 milhões, em parceria com a CPFL Energia, por meio de chamada pública da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). Atualmente, tem recursos também da universidade, além da força de trabalho do corpo estudantil, docentes e funcionários.

O Centro de Operações fica localizado na Cidade Universitária, próximo ao bairro Barão Geraldo, em Campinas, mas, segundo Silva, as melhorias desenvolvidas para eficiência energética também serão aplicadas nas unidades da escola instaladas em Limeira, Piracicaba e Paulínia.

De toda a energia consumida no campus, 7% do uso anual são gerados na própria universidade por meio das placas fotovoltaicas instaladas nos prédios do Ginásio Multidisciplinar (GMU), da Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação (Feec), do Núcleo Interdisciplinar de Planejamento Energético (Nipe), da Escola de Educação Corporativa (Extecamp) e da Faculdade de Engenharia Civil (FEC), bem como em solo, como no Museu Exploratório de Ciências – um total de 2.500 quilowatts-hora (kwh), equivalente para manter em torno de 2 mil casas.

“Temos já em fase de licitação a ampliação da nossa capacidade fotovoltaica para 20%. Mas toda a nossa energia vem de fonte renovável; o que a gente não produz, compra de fonte incentivada”, explica o professor, referindo-se a alternativas como a solar, a eólica, a de biomassa ou advinda de pequenas centrais hidrelétricas.

“Ainda temos muito o que fazer para ser um campus totalmente sustentável, temos muitas ações para combater o desperdício”, frisa ele. É caso do subprojeto “Unicamp 100% LED”, que visa substituir toda a iluminação interna, externa e pública por lâmpadas LED. “Muitas ainda são de vapor de sódio. Estamos na fase da iluminação interna dos prédios, em torno de 120 mil lâmpadas já foram substituídas. Ao final, podemos chegar a uma economia de 70% do consumo”, garante.

No mesmo intuito de modernização e eficiência caminha a ação “sustentabilidade no ar”, com a alteração de mais de 2 mil aparelhos de ar-condicionado. E ainda, a troca das antigas e tóxicas telhas de amianto por telhas “sanduíches”, que melhoram o conforto térmico dos edifícios, diminuindo o uso de climatização.

Ônibus elétrico no eletroponto do campus, e usina fotovoltaica experimental, instalada em solo, que gera 15 kwh

campus ainda conta com um ônibus elétrico, dsponibilizado em parceria com a BYD, abastecido pela energia solar gerada na própria estação de recarregamento (foto abaixo), que atende os serviços gratuitos de passageiros na universidade. “Estamos estudando a possibilidade de ter uma frota de dez a 15 para fazer o transporte circular dentro do campus, conectando-a com a moradia estudantil e arredores”, atesta Silva.

Microrrede de distribuição

Em julho último, o Jornal do Engenheiro acompanhou a reenergização do primeiro quadro elétrico inteligente no campus, parte da elaboração de uma microrrede de distribuição de energia, que compõe o subprojeto “Merge” – Microgrids for Efficient, Reliable and Greener Energy –, realizado pela Unicamp, juntamente com a Universidade Federal do Maranhão (UFMA) e o Instituto Avançado de Pesquisa e Inovação (Iati) e Eletra, financiado pela CPFL através do Programa de Pesquisa e Desenvolvimento regulado pela Aneel.

Nessa etapa, a microrrede vai abastecer os prédios da Faculdade de Educação Física (FEF), a Biblioteca Central Cesar Lattes, a Biblioteca de Obras Raras Fausto Castilho e o GMU, além da iluminação pública dos arredores, uma área de aproximadamente 140 mil metros quadrados. Terá um sistema de armazenamento de 1,27MWh/1MW com baterias de lítio, um gerador a gás natural de 250kVA e geração solar, dez quadros elétricos inteligentes e a implementação de um sistema de gerenciamento que comanda todos os quadros, geração e armazenamento, conforme conta Luiza Higino Silva Santos, uma das engenheiras que acompanha o projeto, doutoranda da Unicamp. 

“Essa microrrede pode operar conectada à rede da CPFL ou isolada”, destaca. Ainda, será possível a operação manual, caso necessário, e a gestão de demanda. “Dependendo da quantidade de energia gerada, a gente pode desligar as cargas não prioritárias remotamente. E a microrrede continuaria operando”, explica. O centro de controle ficará alocado no prédio da Biblioteca Central, no campus, contendo a parte de software e hardware do sistema de gerenciamento da rede, os quais são desenvolvidos pela Hexing Energy. A empresa é responsável pela instação e comissionamento do sistema, que abrange funcionalidades requisitadas pelos pesquisadores, sinalizando, entre outros pontos, os momentos de pico de consumo. “O objetivo principal é que a gente consuma no período noturno a energia renovável que é produzida em excedente no período diurno, por exemplo. A bateria é que vai fazer esse remanejamento”, explica a engenheira.

A microrrede, que entrará em operação ainda este ano, contará com uma modalidade de agendamento da operação, para facilitar testes de melhorias e projetos elaborados na universidade sem comprometer a distribuição de energia. E os benefícios, lista a engenheira, serão tanto econômicos quanto em pesquisa científica e na manutenção da instituição. Sendo autoprodutora de energia, de acordo o professor Silva, a faculdade fica menos suscetível a apagões, tornando-se resiliente às consequências da crise climática.

A engenheira Luiza Higino Silva Santos na estação de abastecimento da microrrede, e a pesquisadora Deborah Valverde Gabriel
 

Já a modernização do prédio da FEF para maior eficiência energética, no escopo do “Merge”, é objeto central do projeto da engenheira Deborah Valverde Gabriel, pesquisadora do Campus Sustentável, mestranda da Feec/Unicamp.

O prédio foi construído na década de 1980, num padrão de edificações simples da universidade apelidado de “pinotinho” – em menção ao reitor à época, José Aristodemo Pinotti. “Por meio da modelagem BIM, simulei exatamente como foi construído e estamos analisando o consumo energético dele, o desempenho para, a partir disso, propor as melhorias”, explica a engenheira.

Extensão

Segundo Silva, a tendência é que as soluções desenvolvidas no Campus Sustentável sejam utilizadas para fazer frente aos desafios da sociedade – resultado que está aliado ao conceito de “laboratório vivo”.

É o caso do projeto de energia renovável para comunidades indígenas isoladas, que atualmente são atendidas por geradores a diesel, por um período curto de tempo. “É energia fóssil e bastante precária, que contamina água, solo. Então estamos desenvolvendo um sistema baseado em energia solar e baterias. Já implantamos dois no Oiapoque e agora a expedição mais recente fez o levantamento energético de 15 comunidades na região do Amazonas”, conta o professor.

Outro projeto é o chamado “Olhos no futuro”, que recebe a visita de estudantes do ensino fundamental e médio para apresentar as inovações sustentáveis do campus. “Eles podem ter contato com tudo isso antes de escolher uma profissão”, ressalta Silva.

Além das ações voltadas à eficiência energética, garante o docente, também são estudadas melhorias de processos em áreas como água, resíduos, fauna e flora. Ele cita o exemplo do projeto de corredores ecológicos no campus: “O laboratório está mapeando toda a área de Mata Atlântica ao redor da universidade para criar espaços em que a biodiversidade seja conservada, inclusive de animais, que acabam morrendo nas proximidades por atropelamentos, entre outras situações”.